Profecia

No AT, um oráculo profético ou mensagem a ser transmitida ao povo era entendida como um “peso” (em hebraico massa) sobre a alma do profeta até que ele pudesse pronunciá-lo (Pv 30.1 e 31.1; cf. Is 13.1; Hc 1.1; Zc 9.1 etc.). Também foi usada a palavra nebu’a, relacionada com nabi’, “pro­ feta” (2 Cr 9.29; 15.8; Ed 6.14; Ne 6.7).

O termo do NT é a palavra grega propheteia, que pode referir-se a uma atividade proféti­ca ou a “profetizar” (Ap 11.6), ao dom de pro­fecia ou a profetizar (Rm 12.6; 1 Co 12.10; 13.3,8,9; 14.1-6 etc.), e a declarações profé­ticas (Mt 13.14; 1 Ts 5.20; 1 Tm 1.18 etc.).

Funções da Profecia

1. Prenunciar. Os profetas foram os primei­ros de todos os prenunciadores e porta-vozes de Deus (veja Profeta). Abraão, quando recebeu e anunciou a aliança que Deus ha­ via feito com ele a respeito de sua semente, foi um profeta (Gn 12,1-3; 15.1; 22.15ss.). Moisés, o maior de todos os profetas deveria receber a Palavra diretamente de Deus e transmiti-la a Arão, que era seu porta-voz (Ex 7.1-2). Como Moisés deveria ser o “deus” do Faraó, o ministério de Arão demonstra perfeitamente o ministério do porta-voz. To­dos aqueles que agem na função de procla­mar a Palavra de Deus são seus porta-vo­zes. E nesse sentido que o crente do NT pode profetizar, quando está diretamente habili­tado pelo Espírito Santo.

Segundo a designação do NT de Lei e Profetas (Mt 11.13; 22.40; Lc 16.16), os escritores de todos os livros subsequentes ao Pentateuco são classificados como “profetas”. Eles foram pro­fetas no sentido de que recontaram a história, manifestaram a glória de Deus através de lou­vores e cânticos, revelaram a sua sabedoria e transmitiram suas advertências sobre o jul­gamento e as promessas de restauração, tudo isso como inspirados porta-vozes de Deus.

2.Profetizar. Embora nem todos o fizessem, muitos profetas previam o futuro. Abraão, como o primeiro homem a receber o nome de profeta, era ao mesmo tempo um prenunciador e um pressagiador. Ele transmitiu a Isaque e seus descendentes a profecia so­bre Israel, que revelava a promessa da pri­meira vinda de Cristo como sua semente (cf. G1 3.8,16), e também a instalação de um reino. Embora os detalhes da aliança de Abraão fossem escassos e ainda pouco dis­tintos, eles formaram a estrutura à qual a aliança de Moisés acrescentou a revelação da apostasia e a rejeição de Israel, segui­ dos por seu arrependimento, regeneração e restauração da terra prometida (Dt 27.12­ 30.20). A certeza dessa restauração foi ates­tada pelo compromisso pessoal assumido por Deus (Jr 31.27-37; 32.27,36-44; 33.2-26; cf. Hb 6.17,18; 8.8-13).

Ela também foi revelada através de Davi, o rei-profeta, na aliança pela qual a sua “casa” ou dinastia duraria para sempre (2 Sm 7.16). Portanto, um Davi maior, igual a Cristo, iria reinar nesse reino restaurado (Jr 33.15-17; Ez 34.23,24; 37.24-28).

Ao mesmo tempo, uma outra e ainda maior linha vital de profecias já havia sido revela­ da depois do pecado de Adâo e Eva. Em Gé­ nesis 3.15 foi dito a Adão e Eva que a se­ mente de Eva iria destruir Satanás. “Esta [semente] te ferirá a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar”. Portanto, a semente mencio­ nada na aliança de Abraão já havia sido re­ velada a Adão. Dessa forma, Genesis 3.15 e 22.18 apontam para a cruz.

Através do AT foram desenvolvidas três li­nhas ou rumos para a profecia.

Uma linha relativa ao Messias sofredor que se sacrificaria, e à primeira vinda do Se­nhor Jesus Cristo (Gn 3.15; 22.18; cf. Gl 3.8,16; Gn 49.10,11; Is 7,14; 9.6; 53; Salmos 16; 22; 69).

Uma segunda linha relativa ao reinado do Messias e à segunda vinda de Cristo como havia sido prometido em 2 Samuel 7 e deli­neado em grandes passagens como Isaías 11; 66; Oséias 1.10,11; Amós 9.11; Zacarias 12.14. Os profetas explicam em detalhes tan­to a segunda vinda do Senhor como as con­dições de paz e prosperidade que acompa­nharão seu reinado (Is 66.15; Zc 12.14).

Uma terceira linha faz o entrelaçamento das profecias da primeira e da segunda vinda de Cristo. Ela está relacionada a certos aconte­cimentos históricos que não estão ligados à primeira nem à segunda vinda, mas que são profecias sobre eventos históricos particula­res, expressas com a finalidade de fortale­cer o povo de Deus em momentos de grande tribulação e sofrimento. Elas desenharam, previamente, certos acontecimentos da his­tória secular. Seus exemplos são a revela­ção do tempo que Israel passou sob a opres­são do Egito, isto é, 400 anos (Gn 15.13; cf. Ex 12.40; Gl 3.17) e 70 anos de cativeiro na Babilónia (Jr 25.11,12; cf. Dn 9.2), e a delineação dos acontecimentos entre os dias de Daniel e a época de Antíoco Epifânio (Dn 11.1-21).

3. Ensinos éticos e sociais. Esse detalhe do ministério dos profetas tem sido muitas ve­zes ignorado nos estudos dos especialistas evangélicos. A primeira tentativa de Moisés para ajudar seus irmãos foi realizada na es­fera social (Ex 2.11). Mais tarde, ele foi gui­ado por Deus para estabelecer os grandes princípios teocráticos da justiça social e eco­nômica encontrados especialmente em Êxodo e Deuteronômio. Amós foi o profeta do AT que afirmou particularmente sua função ao revelar as injustiças sociais existentes no Reino do Norte. Oséias reflete esse mesmo ensino, assim como Isaías. O nosso Senhor cumpriu esta responsabilidade, especialmen­te no Sermão da Montanha e em algumas de suas parábolas.

4. Influência política. Esse aspecto também é muitas vezes negligenciado. Moisés rece­beu a incumbência de exigir a libertação de Israel junto ao Faraó (Ex 6.11; 9.13). Nata devia comparecer perante Davi (2 Sm 12). Isaías confrontou o rei Acaz e aconselhou Ezequias (Is 7; 37). Em diferentes oportunidades, Jeremias recebeu ordens de compa­ recer perante o rei (Jr 22.1; 34.2; 37.7). Daniel compareceu perante Nabucodonosor e Belsazar (Dn 2.19,25; 5.17). A mensagem de Amós chegou ao rei através de um de seus ministros (Am 5.15-17).

5. Mensagem soteriológica, O ministério mais importante desempenhado por um profeta era a transmissão da mensagem da salva­ção. Neste particular, cada ministro do evan­gelho segue os passos dos profetas. Os pro­fetas constantemente advertiam o povo so­bre seus pecados, e insistiam para que se ar­rependessem. Encontramos esses exemplos em Josué exigindo que Israel escolhesse a quem iria servir (Js 24.15). Moisés ministrou bênçãos e maldições, seguidas de um pedido de arrependimento – que só será finalmente cumprido quando Deus dirigir o povo ao ar­ rependimento na segunda vinda de Cristo (Dt 28.1ss.). Jonas exigiu que Nínive se ar­rependesse dentro de 40 dias (Jo 3.4). Esdras orou por aqueles que haviam retomado do exílio, para que confessassem seus pecados e abandonassem as esposas estrangeiras (Ed 9.5-10.11). E João Batista exortou Israel a preparar um caminho em seu coração para a vinda de seu Rei (Lc 3.4-6).